Point da Psicanálise – por Profª
Dra. Cléo Palácio
Um espaço de pausa, reflexão e
reencontro consigo.
Aqui, a psicanálise ganha voz
viva, coração pulsante e linguagem acessível.
Este é o Point da Psicanálise, o
lugar onde teoria e experiência se encontram, e o saber científico se torna
também encontro humano. Texto
adaptado e comentado por Profª Dra. Cléo Palácio – CMP Palácio Desenvolvimento
Humano, Educacional e Profissional
Síndrome do Pensamento Acelerado (SPA): o que é, por que surge e como a
Psicanálise e a Neurociência explicam esse fenômeno
A
Síndrome do Pensamento Acelerado (SPA) tornou-se um tema central nas
discussões sobre saúde mental contemporânea. Embora não seja um diagnóstico
oficial presente no DSM-5, o termo foi desenvolvido e amplamente difundido pelo
Dr. Augusto Cury, psiquiatra e pesquisador brasileiro, para descrever um
conjunto de sintomas ligados ao excesso de pensamentos, hiperativação mental e
dificuldade de “desligar” o cérebro.
Hoje,
a SPA é compreendida não apenas pela psiquiatria, mas também pela psicanálise
e pela neurociência, que ajudam a explicar como a mente e o cérebro
respondem ao ritmo acelerado da vida moderna.
1.
O que é a Síndrome do Pensamento Acelerado (SPA)?
Segundo
Augusto Cury (2005, 2013), a SPA é caracterizada por:
·
excesso
de pensamentos simultâneos;
·
dificuldade
em desacelerar mentalmente;
·
ansiedade
constante;
·
irritabilidade;
·
sensação
de que o cérebro “não desliga”;
·
cansaço
mental ou esgotamento emocional;
·
queda
na concentração e na memória;
·
sono
superficial ou não reparador.
Cury
afirma que a SPA é fruto da hiperestimulação do cérebro: excesso de
informação, trabalho contínuo, pressão emocional e ausência de pausas.
Na
prática clínica, muitos pacientes relatam que:
“A
cabeça não para. Eu deito, mas o pensamento continua correndo.”
2.
Como a Neurociência explica a SPA
Autores
como Joseph LeDoux (1996; 2015), Daniel Siegel (2012) e Robert
Sapolsky (2017) ajudam a compreender o que acontece no cérebro.
2.1.
Sistema de alerta hiperativado
LeDoux
demonstra que a amígdala, área responsável por detectar ameaças, fica
hiperestimulada quando o cérebro vive em constante tensão. Isso faz com que a
pessoa entre em “modo alerta” o tempo todo.
2.2.
Estresse crônico e cortisol
Sapolsky
mostra que altos níveis de cortisol prejudicam:
·
memória,
·
concentração,
·
qualidade
do sono,
·
tomada
de decisão.
Isso
explica por que a SPA leva a exaustão mental.
2.3.
Falta de integração neural
Siegel
apresenta o conceito de “mentes desintegradas”: quando emoções, pensamentos e
sensações não se organizam de forma harmoniosa, o sistema nervoso perde
capacidade de regular o fluxo mental.
Resultado:
pensamento acelerado descontrolado.
3.
A Síndrome do Pensamento Acelerado na visão da Psicanálise
A
psicanálise não usa o termo “SPA”, mas interpreta o fenômeno como resultado de
conflitos internos, excesso de exigências do superego, angústia, ansiedade e
mecanismos inconscientes.
3.1.
Freud: o excesso de excitação psíquica
Freud
(1920) explica que, quando a mente recebe mais estímulos do que pode processar,
ela entra em estado de “sobrecarga psíquica”, produzindo:
·
ansiedade,
·
pensamentos
intrusivos,
·
insônia,
·
dificuldade
de concentração.
Isso
se aproxima muito do quadro da SPA.
3.2.
Winnicott: falta de descanso psíquico
Para
Winnicott (1958; 1965), o sujeito precisa de experiências de quietude e acolhimento
interno para se sentir integrado. Sem espaços de pausa, surge um estado
mental hiperagitado.
3.3.
Lacan: o sujeito dividido e o excesso de demandas
Lacan
discute que vivemos sob o imperativo moderno do “goza!”, que exige:
·
produtividade,
·
desempenho,
·
respostas
rápidas,
·
perfeição.
Essa
pressão produz ansiedade e aceleração mental, fenômenos presentes na SPA.
4.
Sintomas mais comuns observados na clínica
Profissionais
relatam que pessoas com SPA apresentam:
·
mente
hiperativa à noite
·
dificuldade
de permanecer no presente
·
dificuldade
de finalizar tarefas
·
irritabilidade
sem motivo aparente
·
sensação
de inadequação
·
baixa
tolerância à frustração
·
sensação
de esgotamento constante
·
memória
reduzida
·
fala
acelerada ou dispersa
·
fadiga
emocional
Esses
sinais também são descritos em estudos sobre ansiedade, atenção e estresse
crônico na literatura neurocientífica.
5.
Fatores que contribuem para o desenvolvimento da SPA
Autores
como Bessel van der Kolk, Sapolsky, Damásio e Cury
revelam fatores que alimentam a aceleração mental:
✔ Sobrecarga emocional
✔ Pressão por produtividade
✔ Excesso de telas e estímulos digitais
✔ Conflitos internos e experiências traumáticas
✔ Falta de descanso psíquico
✔ Insônia e má higiene do sono
✔ Exigência interna (superego rígido)
✔ Falta de autocuidado e pausas
A
mente tenta “produzir respostas” para tudo, e entra em looping.
6.
Como a Psicanálise pode ajudar quem sofre com SPA
A
psicanálise oferece uma compreensão profunda das causas internas que alimentam
a aceleração mental.
6.1.
Nomear o que o sujeito vive
Ao
falar livremente, o paciente traz material inconsciente que organiza sua
experiência. A fala reduz a intensidade dos pensamentos acelerados.
6.2.
Identificar conflitos internos
A
aceleração mental pode ser uma defesa inconsciente para:
·
evitar
sentir dor emocional,
·
evitar
pensar em algo angustiante,
·
fugir
de conflitos internos.
O
processo analítico ajuda a identificar essas raízes.
6.3.
Construir espaços internos de pausa
A
psicanálise cria, simbolicamente, um ambiente onde a mente pode desacelerar e
se integrar.
6.4.
Redução da autocrítica
A
SPA é alimentada por um superego cruel. A análise suaviza essa exigência
interna.
7.
Como a neurociência contribui no tratamento
✔ Técnicas de regulação do sistema nervoso
✔ Higiene do sono
✔ Redução de estímulos
✔ Respiração consciente (regulação do nervo vago)
✔ Estratégias para reduzir cortisol
✔ Criação de rotinas reparadoras
Solms
e Panksepp mostram que estados emocionais desregulados pioram o fluxo do
pensamento, e podem ser modulados com intervenção adequada.
8.
Conclusão
A
Síndrome do Pensamento Acelerado é um fenômeno real, crescente e
multifatorial, que combina:
·
exigências
da sociedade moderna,
·
alterações
emocionais,
·
sobrecarga
psíquica,
·
hiperativação
cerebral.
A
união entre Psicanálise e Neurociência oferece um caminho sólido
para compreender e tratar a SPA, permitindo que o sujeito:
·
retome
seu ritmo interno,
·
compreenda
seus conflitos,
·
recupere
o descanso da mente,
·
reconstrua
sua saúde emocional e cognitiva.
Referências
CURY,
Augusto. Ansiedade:
como enfrentar o mal do século. São Paulo: Saraiva, 2013.
DAMÁSIO,
Antonio. O erro de Descartes. São Paulo:
Companhia das Letras, 1996.
FREUD,
Sigmund. Além do Princípio do Prazer. Rio de
Janeiro: Imago, 1996.
LACAN,
Jacques. Escritos. Rio de Janeiro: Zahar,
1998.
LEDoux,
Joseph. The Emotional Brain. New York: Simon
& Schuster, 1996.
SAPOLSKY,
Robert. Why Zebras Don’t Get Ulcers. New
York: Henry Holt, 2017.
SIEGEL,
Daniel. The Developing Mind. New York:
Guilford Press, 2012.
VAN
DER KOLK, Bessel.
The Body Keeps the Score. New
York: Viking, 2014.
WINNICOTT,
Donald. O Brincar e a Realidade. Rio de
Janeiro: Imago, 1975.
Nota
Ética e Autoral
Nota
Ética:
Este
conteúdo foi elaborado com base em referências acadêmicas, estudos
clássicos da Psicanálise, pesquisas contemporâneas da Neurociência
e obras científicas amplamente reconhecidas. O texto apresenta uma interpretação
autoral destinada à divulgação científica e educativa, mantendo compromisso
com a ética profissional e respeito às fontes originais.
As
ideias aqui expostas não substituem avaliação clínica individualizada e devem
ser compreendidas como material informativo para estudantes, profissionais e
interessados na área.